16/01/2008

Anúncio para jornalista ou talvez não!

Todos sabemos que o mercado jornalístico não está nos melhores dias e que os anúncios são cada vez mais escassos. De vez em quando, recebo alguns alertas de anúncios de emprego e ontem houve um que me deixou curiosa. Costumo mandar algumas destas escassas oportunidades a amigos que ainda estão desempregados nesta dura vida de jornalista ou mesmo para evoluir enquanto carreira e profissional. Nunca se sabe quando nos deparamos com uma nova oportunidade, pelo que estou permanentemente atenta. No entanto, não consegui mandar este anúncio a ninguém nem ajudar nenhum amigo da área. E porquê? Porque as funções exigidas são muito variadas e vão além da profissão de jornalista. A referida oferta pede um(a) jornalista para cobrir eventos e redigir artigos. Até aqui, tudo muito bem. Nada de surpreendente para a função que desempenho diariamente e a profissão que escolhi. A melhor parte vem a seguir: a pessoa a recrutar deverá "vender publicidade e assinaturas", o que a empresa intitula de "colaborador para todo o tipo de trabalho inerente à gestão de um jornal". Curioso é que não exigem carteira profissional de jornalista, o que não é de estranhar. Qualquer jornalista sabe que um dos princípios deontológicos desta profissão é, e passo novamente a citar, "O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios susceptíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional". Ora, parece-me claro que um jornalista não é comercial e que a integridade desta profissão obriga a que não se envolva em vendas directas de publicidade, ainda que, para uma mesma publicação onde seja responsável por conteúdos.
Raras são as oportunidades no meio do jornalismo e, pelo contrário, são muitos os anúncios à procura de comerciais. Cada um no seu posto e com as suas funções. Misturar as duas profissões e exigir que um colaborador se envolva em ambas é que me parece meio sinistro. Pena é que os escassos anúncios que vão surgindo sejam de estágio, mal remunerados ou a solicitar o típico "colaborador pau para toda a obra", que é como quem diz, "polivalência acima de tudo". Esta é a actual realidade por que passa a classe jornalística e este anúncio foi publicado num conceituado site de emprego na área de comunicação. Acredito que as respostas tenham sido imensas, a avaliar a quantidade de colegas licenciados que não têm emprego ou trabalham em áreas muito diferentes daquela no qual se formaram.
Com estes pequenos exemplos, como é que um jornalista pode crer num futuro melhor? Fiquei tão surpreendida com as funções exigidas pela empresa, que não quis deixar de partilhar convosco.

7 comentários:

Capitão-Mor disse...

Por essas e outras é que me desviei destes rumos jornalísticos. Estágios sem fim, má remuneração...
Salvou-se a base académica que absorvi no ISCSP. O jornalismo accho que ficou para trás de vez...

Anónimo disse...

É pau para toda a obra, seja em jornalismo seja no que for! É este o retrato do nosso país, seja a nível profissional ou a outro nível qualquer! Não é à toa que a nossa fama no estrangeiro é a de desenrascados! E não é à toa que tudo é feito em cima do joelho, que não há planeamento para nada e que o nosso país não vai para a frente. A única solução é mesmo mudar. Como dizia o outro, para mudar uma nação, é preciso mudar cada indivíduo...
Beijo!
Ivana

Andreia Azevedo Moreira disse...

A propósito disto uma peça de teatro que muito me fez rir mas que infelizmente retrata primorosamente a nossa realidade com o toque de humor que situações desesperadas exigem (não se vá decidir pôr efectivamente uma corda ao pescoço): COÇAR ONDE É PRECISO! Somos um país de jeitosos. Tirámos um curso mas andamos a ter jeito para isto ou para aquilo. Se eu soubesse o que sei hoje, não sei não... E nem me posso queixar muito pois mal ou bem (e devo admitir que tem sido mais pro bem) tenho trabalhado sempre na área. Bjinhos Cláudia e parabéns pela tua integridade e profissionalismo!

Anónimo disse...

Isto apesar de não ter muito a ver, fez-me lembrar um episódio de quando eu era ainda uma moça virada para as teatrices. Eu e uma colega vimos num jornal um anúncio para actores maiores de 18. A minha colega (bless her) queria concorrer porque já tinha 19... Enfim, viva a inocência!
Cláudinha minha linda isto não acontece só no jornalismo, infelizmente a palavra "polivalência" tem cada vez mais o significado de "pau para toda a obra". Bjs.

Cláudia Pinto disse...

Amigos,

Eu sei que é assim em todas as profissões mas não consigo deixar de ficar chocada com certas situações relacionadas com o mundo profissional. Choca-me que não haja organização e que os funcionários não sejam recompensados e valorizados para desempenhar funções em que se especializaram. Também tenho a sorte de ter trabalhado sempre na área, tal como a Andreia, mesmo quando me apetece desistir. Todos nos queixamos, por uns motivos ou por outros. No entanto, sinto-me envergonhada com um anúncio que mistura a profissão de jornalista e de comercial num mesmo futuro colaborador quando, na realidade, as duas funções nada têm a ver uma com a outra. Nem é suposto um jornalista vender ou trabalhar com esse tipo de fins. Não é suposto ter carteira profissional e angariar publicidade num mesmo jornal onde se escreve e desenvolve conteúdos. Tal como o comercial não tem competência para relatar histórias, fazer entrevistas, cobrir eventos. Cada um no seu lugar! Sei que a tendência é cada vez mais assim e as profissões deixaram de ser a realização da função para o qual determinada pessoa se licenciou. Quando penso nisto, penso ainda no quanto andava iludida na faculdade. Costumo dizer que a utopia era a palavra de ordem dos tempos de faculdade e de licenciatura, onde sabíamos que as coisas estavam más e o mercado nem sempre estava aberto a oportunidades para todos, mas não tínhamos a noção de que estaria assim tão mau. A dura realidade pós licenciatura é que deixa qualquer um desmotivado. Temos é de saber lidar com as dificuldades e tentar desempenhar a nossa profissão, aquela que escolhemos e para a qual estudámos anos a fio e abdicámos de tanta coisa, da melhor forma que conseguirmos.

Obrigada pelas vossas palavras!

Capitão-Mor disse...

Passei para te desejar um óptimo fim de semana!

Marisa disse...

Estou a tirar uma licenciatura na Faculdade de Letras em Lisboa que, na teoria, me vai abrir portas na área de comunicação social, entada-se: radio, tv, jornais, revistas, e tudo e tudo e tudo. Desde muito nova que o meu sonho é ser jornalista e por isso me inscrevi neste curso mas é ao ler este tipo de coisas que fico cada vez mais desmotivada e assustada. Quando me perguntam o que vou fazer depois de acabar o curso a minha resposta é sempre a mesma: enviar curriculos para tudo quanto é sitio que esteja ligado a comunicação social, na esperança que apareça alguma coisa!